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05/11/2021
A ciência de resultados da Pfizer no Brasil

Veículo: IstoÉ Dinheiro 

Jornalista: Hugo Cilo

Desde fevereiro, a rotina da executiva espanhola Marta Díez virou de ponta-cabeça. Por ordem da matriz americana, ela trocou o comando da Pfizer no Chile pela presidência da subsidiária no Brasil – a segunda maior operação da companhia entre os mercados emergentes, atrás apenas da China, e uma das top dez no mundo. Os desafios e os problemas a serem enfrentados, proporcionais ao tamanho do País, ficaram ainda maiores pela necessidade de distanciamento social. Até agosto, a executiva teve de pilotar uma empresa com 1,6 mil funcionários a partir de sua casa, em Santiago. “Foram meses muito complexos. Todas as reuniões eram de forma remota, assim como as negociações de venda de medicamentos e vacinas para o governo”, afirmou a presidente, em entrevista exclusiva à DINHEIRO. “Mas conseguimos manter todas as áreas da empresa em sintonia e suprir à disparada da demanda de todos os produtos necessários para o enfrentamento da pandemia”, disse Marta, a primeira mulher a ocupar o alto comando da Pfizer no Brasil. Ela já passou por empresas como Sandoz e GE.
 
Os números da Pfizer endossam essa disparada. A companhia prevê fechar 2021 com faturamento global de US$ 82 bilhões, valor 95% superior aos US$ 41,9 bilhões de 2020. Neste ano, somente com vacinas, a Pfizer terá receita de aproximadamente US$ 36 bilhões, quase tudo que a empresa vendeu no ano passado. No Brasil, embora a Pfizer não revele as cifras, Marta disse que o faturamento nos últimos 12 meses, excluindo as vacinas, cresceu 22%. “É até difícil comparar os resultados de um período de pandemia, com hospitais lotados e procura por medicamentos, sedativos e vacinas, com épocas normais para o setor da saúde”, afirmou. “Por isso, a lição que fica é que a só a ciência traz resultados concretos. Precisamos de mais investimentos em saúde para estarmos prontos ao enfretamento das próximas doenças.”
 
Com essa filosofia de guerra, o pilar das estratégias da Pfizer no Brasil será a produção em larga escala – inicialmente de 100 milhões de doses por ano – da vacina ComiRNAty. No segundo semestre de 2022, o imunizante para Covid-19, atualmente desenvolvido pela Pfizer e pela a BioNTech, será produzido e distribuído em toda a América Latina pelo laboratório brasileiro Eurofarma. Com essa unidade, o Brasil se tornará o quarto hub global de produção de vacinas da Pfizer, ao lado de EUA, Bélgica e África do Sul. Para facilitar o envolvimento da Eurofarma no processo, as atividades de transferência técnica, desenvolvimento no local e instalação de equipamentos começaram em agosto. Desde março deste ano, quando a Pfizer fez o primeiro contrato com o Ministério da Saúde, o laboratório já vendeu 200 milhões de doses ao País, cerca de 10% das 2,3 bilhões de doses no mundo todo. Até o final do ano, devem ser entregues 3 bilhões de doses a um preço médio de US$ 15,6. “A aplicação de doses de reforço é vista como certa porque os estudos até agora já mostram que a resposta imune depende de três doses ou mais”, disse Denise Garrett, vice-presidente do Sabin Institute, nos EUA.
 
Em paralelo à produção de vacinas, a Pfizer quer avançar nos estudos e produção de antivirais para a Covid-19 e suas mutações, como a variante Delta. Os testes clínicos de um medicamento da marca estão em curso no Brasil. A pesquisa utiliza a molécula PF-07321332, um antiviral da classe dos inibidores de protease. Segundo a farmacêutica, o remédio, administrado via oral, já mostrou potencial para ser utilizado contra o novo coronavírus. A molécula que está sendo estudada foi aprovada na fase 1, que testa segurança e tolerabilidade em humanos. Considerando os resultados já obtidos, incluindo a fase pré-clínica, com testes in vitro, a Pfizer desenvolve agora três estudos pivotais, randomizados, duplo-cego e controlados por placebo. Para serem realizados no Brasil, os estudos são previamente aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).
 
O aval para um antiviral no Brasil também não deve demorar. Na quinta-feira (4), o órgão regulador de medicamentos britânico (MHRA) aprovou uma pílula antiviral contra a Covid-19, desenvolvida em parceria pela farmacêutica MSD e pela Ridgeback Biotherapeutics. Assim, o Reino Unido se tornou o primeiro país a liberar um tratamento que tem o potencial de mudar o curso da pandemia. A agência recomendou que o produto, chamado Molnupiravir, seja usado o mais rapidamente possível após um diagnóstico positivo e cinco dias após o início dos sintomas.
 
Sob a análise da Anvisa estará nos próximos dias um pedido da Pfizer para iniciar a imunização de crianças com mais de 5 anos. Nos EUA, esse grupo começou a receber a vacina na terça-feira (2), depois do sinal verde do FDA, a agência reguladora americana. O governador de São Paulo, João Doria, chegou a anunciar que o estado pediria à Anvisa a urgência na autorização, mas o órgão informou que o pedido precisa partir do fabricante. Em nota, a Pfizer informou que submissão do pedido junto à Anvisa para a aprovação do uso da vacina ComiRNAty em crianças entre cinco e onze anos deve ocorrer ainda em novembro.
 
Vacinação permanente
 
A fórmula brasileira da Pfizer no Brasil se ancora em uma provável necessidade de vacinação permanente de reforço, como já ocorre anualmente com as campanhas de imunização da gripe. Embora o Brasil esteja avançado na taxa de vacinação , com 155 milhões de pessoas com a primeira dose (75% da população) e 117 milhões com o esquema vacinal completo (55%), acende o sinal de alerta o aumento dos casos de infecções por coronavírus na Europa. Na quinta-feira (4), a Organização Mundial da Saúde (OMS) descreveu a nova onda como uma “preocupação grave”, especialmente com a proximidade do inverno no Hemisfério Norte. “O ritmo atual da transmissão nos 53 países europeus é uma preocupação grave”, disse o chefe regional da OMS, Hans Kluge, em entrevista coletiva. O executivo afirmou que a disseminação foi exacerbada pela variante Delta, que é mais transmissível. “Se mantivermos essa trajetória poderemos ter mais meio milhão de mortes por Covid-19 na região entre agora e fevereiro.”
 
A Europa somou quase 1,8 milhão de casos novos na semana passada, um aumento de 6% na comparação com a semana anterior. O número de mortes subiu 12% no mesmo período. A Alemanha, a maior economia da Europa, relatou 33.949 infecções novas, o maior aumento diário desde o início da pandemia no ano passado. Os casos da Rússia e da Ucrânia estão em disparada. O número diário de infecções de coronavírus da Áustria atingiu um recorde estabelecido um ano atrás. O governo local estuda impor um lockdown para os não-vacinados. As ocorrências da Covid-19 na Inglaterra atingiram o nível mais elevado já registrado em outubro, segundo o Imperial College de Londres, liderado por uma quantidade alta de casos em crianças. Eslováquia, Hungria, Polônia, Croácia e Eslovênia também relataram infecções diárias recordes.
 
Antivacinas 
 
Com o esforço de garantir a produção de medicamentos e vacinas para o futuro, a presidente da Pfizer terá de orquestrar uma ofensiva contra as fake news. A empresa contratou a agência Olgivy para lançar a campanha Tomar para Retomar, com o ex-apresentador da Globo Thiago Leifert. “Estamos empenhados e desfazer essa onda crescente de desinformação sobre as vacinas no Brasil e no mundo”, afirmou Marta, que admite receber diariamente informações equivocadas sobre a vacina em seus grupos de WhatsApp. “Mas vejo que o Brasil é um dos países que precisam de menos convencimento para tomar vacina. Aqui existe a cultura e a consciência de que as vacinas salvam vidas. Por isso, o Brasil e a Pfizer são importantes como partes da solução da pandemia.”
 
ENTREVISTA: Marta Díez, presidente da Pfizer Brasil
“O grande legado da pandemia é a valorização da ciência”
 
Como foram seus primeiros dias como presidente da Pfizer no Brasil?
Marta Díez - Foram intensos. Eu comandava a operação no Chile e fui nomeada para o Brasil em fevereiro, em um momento muito difícil da pandemia. Naquela época, a Pfizer estava em meio às negociações de venda da vacina. Os primeiros cinco meses foram todos remotos. Assumi a operação, mas não estava no Brasil. Tive de fazer tudo a distância.
 
Sua percepção sobre o mercado local mudou depois de chegar aqui?
Marta Díez - Sempre estudei muito o mercado brasileiro. Por razões óbvias. O Brasil é o maior mercado para a Pfizer na América Latina, o segundo maior no grupo de países emergentes, atrás apenas da China, e um dos top dez no mundo. Tudo o que acontece aqui repercute na companhia no mundo todo. Apesar dessa importância, só fui conhecer com profundidade quando cheguei aqui.
 
O que viu depois de conhecer mais?
Marta Díez - Vi que o Brasil é um país diferente. Diferente do Chile, da Espanha, do México. Todos os países têm suas próprias realidades. Mas ter um sistema público de saúde que abrange toda a população, assim como no modelo europeu, faz toda a diferença em um momento de pandemia.
 
O SUS está no nível da Europa?
Marta Díez - A diferença é quão rápido entram os medicamentos no mercado. Em um país europeu, novos medicamentos ficam acessíveis com mais agilidade. Existem medicamentos inovadores que agência regulatória europeia libera em, no máximo, dois anos. Aqui, alguns medicamentos chegam a perder a patente.
 
A Anvisa atrapalha?
Marta Díez - Não. Os brasileiros precisam ter orgulho da Anvisa. É uma agência muito bem reconhecida lá fora. Ter uma agência de alto nível implica em muito trabalho para a agência e para as empresas. Mas isso traz uma segurança maior para a população.
 
E quanto ao SUS?
Marta Díez - Ter um sistema unificado de cobertura médica ajudou demais o País no combate à pandemia. Não existia isso no Chile. Um dos maiores aprendizados que ficam para o Brasil é a importância do investimento em saúde. Claramente, a pandemia mostrou que é preciso mais investimentos para se ter um sistema de saúde robusto e com capacidade de atendimento em situações de emergência.
 
Por que o Brasil teve um desempenho ruim no começo, mesmo com o SUS?
Marta Díez - O problema é complexo. No começo do combate à pandemia, o Brasil não dependia apenas do SUS. Ele tem seus problemas, sim, mas não foi responsável pelo agravamento da pandemia. Foram muitos fatores. Nem de medidas de quarentena ou lockdown, como muitos países adotaram. Decisões sobre vacinação pesavam nessa questão.
 
O movimento antivacina, com apoio do presidente Bolsonaro, influenciou?
Marta Díez - Esse fenômeno antivacina eu não consigo entender. Tiro minhas conclusões com base na ciência e nos números. Temos que olhar para os fatos. Antes, as pessoas morriam sem vacinas e sem antibióticos. As inovações da ciência e da medicina salvam vidas. No Brasil morrem mais de 600 mil pessoas pela Covid-19, mais do que qualquer outra doença. Mas parece que as pessoas se esqueceram disso.
 
O faturamento da Pfizer foi recorde desde o início da pandemia. Como a companhia enxerga o mundo pós-Covid?
Marta Díez - O foco é em como vamos sustentar nosso crescimento. O maior legado da pandemia será a demonstração pública do poder da ciência. Não devemos voltar aos patamares anteriores. O principal legado da pandemia é a valorização da ciência, do poder da pesquisa e da importância de se ter um sistema de saúde robusto. Ter o SUS é algo que não tem preço quando se trata de salvar vidas.
 
Mas a ciência não foi valorizada pelo governo brasileiro na pandemia…
Marta Díez - A pesquisa e a ciência foram capazes de desenvolver e produzir as vacinas, desenvolver antivirais. Só isso vai tirar o Brasil e todos os outros países da pandemia. O governo brasileiro gastou muito dinheiro em saúde neste ano. Isso é algo que precisa se manter.
 
Algum governo vai gastar tanto com saúde fora de uma pandemia?
Marta Díez - Precisamos estar preparados não só para a Covid-19, mas para muitas outras doenças que virão ou mesmo aquelas que deixaram de ser tratadas na pandemia. Em câncer, há muitos diagnósticos defasados. Uma pesquisa mostrou que, em apenas dois meses, 50 mil brasileiros deixaram de ser diagnosticados com câncer. Sabemos que os diagnósticos tardios vão repercutir mal no sistema público de saúde.
 
Se a população brasileira vai estar imunizada nos próximos meses, por que a Pfizer vai produzir 100 milhões de doses por ano a partir de 2022?
Marta Díez - A verdade é que ninguém sabe se será preciso ou não vacinação anual. É um risco que corremos. Se for preciso ter reforços anuais de vacinas, estaremos preparados. Em 2022, seguramente será preciso. Temos como filosofia estar sempre prontos. Nossa fábrica vai começar a produzir no segundo semestre de 2022, e terá uma capacidade de 100 milhões de doses por ano. É metade das 200 milhões de doses que assinamos com o governo em 2021. Em 2022, teremos de reforçar, no mínimo, os grupos de maior risco, como idosos e pessoas com imunidade comprometida.
 
E se o Brasil não precisar das vacinas de reforço?
Marta Díez - Nossa produção no Brasil também será exportada para toda a América Latina. Todas as vacinas perdem a proteção ao longo do tempo. Estamos fazendo estudos clínicos para saber quanto tempo a imunidade começa a baixar.
 
A Pfizer está contando com a vacinação de crianças?
Marta Díez - A FDA [agência reguladora de medicamentos nos Estados Unidos] já deu autorização para uma terceira dose de reforço, com intervalo de seis meses. Na Anvisa, entrará em análise neste mês de novembro. As crianças compõem um grupo que, em geral, não sofre tanto com a Covid-19, mas que transmite a doença.
 
O movimento antivacina deve crescer com a liberação para crianças?
Marta Díez - Vacinar é um gesto de responsabilidade social. Você pode se contaminar e não morrer. Mas pode matar alguém. Não é uma questão de individualidade. Quem tem câncer e não quer enfrentar um tratamento, toma uma decisão individual. Quem deixa de se vacinar, toma uma decisão coletiva. A vacina não protege apenas o vacinado, mas protege toda a sociedade.
 
A Pfizer vai tentar convencer o presidente Bolsonaro a tomar a vacina?
Marta Díez - Seria muito bom conseguir. 

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